quarta-feira, 23 de março de 2016

República do "teje" preso





Na República de Abril




Por Nagib Jorge Neto

Jornalista, Prêmio Esso Nacional de Informação Econômica, bacharel em direito e escritor.

Nesta República do “teje preso”, ou de “um abril sem fim”, em tempos de ditadura ou de democracia, os intérpretes ou guardiões da lei agem quase sempre certos de que as suas decisões ninguém questiona ou deixa de cumprir. Assim a deusa “Themis, que nada teme” tentou reagir aos atos arbitrários do governo militar, com cassações de parlamentares, prisões e torturas de servidores públicos, professores, religiosos, líderes sindicais e estudantis. 
Diante da violência, o presidente do Supremo (1964), ministro Ribeiro da Costa, entregou as chaves ao general presidente, marechal Castelo Branco, por discordar da “intenção de fazer com que o STF desse a impressão de ser composto por onze carneiros, que expressavam sua debilidade moral, fraqueza e submissão”. 

O general Castelo não aceitou o fechamento do STF, mas sob pressão de seus aliados - Costa e Silva, Carlos Guedes e Mourão Filho - decidiu aumentar para 16 o número de ministros. Depois puniu os ministros Victor Nunes Leal, Hermes Lima, Evandro Lins e Silva (cassados); Gonçalves de Oliveira, Lafayette de Andrada (saíram por discordar das cassações); e Adauto Lúcio Cardoso (deixou a corte por discordar da lei de censura prévia). - {Jogou a toga no chão.}


Na época, o STF ficou com 11 ministros, que aceitaram passivamente as denúncias, prisões, torturas, desaparecimentos e mortes em tiroteios simulados. Os “revolucionários” aceitavam qualquer delação, prendiam sem provas ou forjavam provas, numa espécie de aceitação do “domínio do fato”, teoria do alemão Klaus Roxim, que exige provas e entre nós foi deformada pelo ex-ministro Joaquim Barbosa, que condenou com base em indícios, testemunhos, com aprovação de quase todos integrantes da corte. 

Essa medida, tal como no regime militar, vem sendo a norma das ações do juiz Sérgio Moro, e dos procuradores, que agem à revelia da lei, da Constituição, com base em denúncias típicas do regime militar, agora sob a forma de “delação premiada”. A rigor são bandidos que atuam na base do ouvi dizer; ou que ele ou alguém tem provas e daí são louvados como heróis, pessoas de bem, pela mídia e pela oposição, por políticos como Aécio Neves, Ronaldo Caiado, Roberto Freire, Jarbas Vasconcelos, Eduardo Cunha e Agripino Maia. Eles são partidários de um golpe de Estado pelo Congresso ou pelo Tribunal de Contas da União, com respaldo do STF - Corte que tem a primazia de errar por último, segundo Nelson Hungria - e que de forma subliminar vem tentando forçar o governo a aceitar um aumento absurdo para os servidores do Judiciário. Enfim persiste a república do “teje preso” ou do país que começa e termina em “um abril sem fim”, na visão do grande poeta; teatrólogo e engenheiro pernambucano Joaquim Cardozo.

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quinta-feira, 17 de março de 2016

Sítio São José e circunstâncias





Dou continuidade às boas proezas do velho João Fernandes da Costa, meu avô paterno. – (Saudosas lembranças!) – Ele tinha lá suas manhas. Como eu disse antes, meu avô não tinha propensão pra senhor de escravos. – Mas tinha lá suas inclinações pelas mulatinhas que pintassem na rede configurada do velho João. – Para ele, tanto fazia ser negrinha, como branquinha. Todas eram bem tratadas. E bem alimentadas, à base de mandioca. – Isto é, da massa da mandioca (aipim), mãe!

Para que não se faça mau juízo, explico melhor: - Meu avô cultivava fruteiras e outras lavouras. – Inclusive plantava mandioca. – Por isso mesmo, ao lado da casa de residência, havia uma “casinha de farinha” (lugar onde é preparada a massa da mandioca pra ser transformada em farinha de mandioca).

Outra: - lembro-me bem de que o velho João Fernandes era dado a umas poesias. – Só que a literatura dele era literatura de cordel. – Mas das boas. – À noite, costumeiramente, juntava gente na casa do meu avô. – Chegavam homens e mulheres. - Eram convidados (as) a entrar e sentarem-se ao redor e ao lado de uma mesa grande, na sala principal da casa. – Nisso, iam logo dizendo: “A gente veio pra ver seu João ‘dizer’ poesias.” – Aí o velho se soltava. – Tanto “dizia” poesia, como dizia as boas doidices saídas da cabeça dele. – Ele tinha muita presença de espírito. – Se houvesse tido acesso aos estudos, poderia ir longe.

Mas, já que não alcançou estudos, nem por isso deixou de viver sua vidinha feliz e alegremente! – Curtindo as negrinhas e as branquinhas, que se dispusessem a cair nas graças do velho João Fernandes.

2. Porém, de tanto falar em negrinhas etc. e tal, faz-se necessário abrir um parêntesis pra esclarecer alguns detalhes a respeito. – Vejamos: naquele tempo, chamar de negra ou negrinha, não dava cadeia. E hoje, também, não dá, salvo em certos casos. – Porque negra é a raça. E negrinha, tanto pode ser pejorativo, quanto pode ser afetuoso! – Depende do tom de voz e das circunstâncias.

Tratar uma negra por “negrinha ou negra metida a gente”, é ofensa, injúria. - Do mesmo modo: dizer que “essa branquela mete o bedelho onde não lhe cabe”, é igualmente, injúria e ofensa. O que pode dar processo, mas nem sempre dá cadeia, é a injúria, o preconceito, a discriminação etc.

 Nada obstante, as pessoas hoje querem pegar na palavra, mesmo sem saber onde o galo canta. E por qualquer bate-boca, vêm com essa de racismo e outras idiotices; e “teje” preso! – Algumas e alguns falam logo no art. 5º, inciso XLII, da nossa Constituição Federal. E dizem que é crime imprescritível e inafiançável (?).

Repetindo: dizer "essa negrinha doidona” é igual a dizer “essa branquela doidinha”. – Tanto faz dar na cabeça, como na cabeça dar. – Até aí, nada demais. – A depender do tom de voz, isso pode ser ofensa, injúria, agressão verbal.

Assim como pode ser prova de carinho, se o tom da voz for afetuoso! São maneiras de falar sobre determinada pessoa que caracterizam ou não a injúria, lesão danosa. – Mais: chamar um negro de negro safado é igual a chamar um branco de branco safado. Isso não é racismo. É, tão somente, injúria, menosprezo, agressão verbal. – Mais adiante, volto a este assunto, trazendo um caso concreto. -¡Hasta la próxima!


sábado, 12 de março de 2016

Sítio São José



José Fernandes Costa
Hoje vamos falar de coisas amenas. Mas antes, ainda falo sobre uma jovem. Ela escreveu, entre outras coisas, no dia 11.6, ao dirigir-se a mim: "... faço desde ‘galinha de cabidela’ até feijoada; que todos atribuem essas iguarias aos nossos escravos; mas é..." – Os grifos são meus. – Por que dizer: “... aos nossos escravos...” – Ela mantém escravidão nas tuas fazendas de gado leiteiro?

Com isso, resvalo no tempo, em direção à minha meninice: e confesso que o velho João Fernandes da Costa, meu avô, nunca foi senhor de escravos. 

O velho João Fernandes foi senhor só do Sítio São José. Além de atirar em veados, pescar, caçar e contar certas bravatas, o velho João era chegado a umas negrinhas ou branquinhas, lá mesmo do sítio dele; quem sabe, também dos sítios dos vizinhos. Ainda que os vizinhos fossem os filhos legítimos do velho João Fernandes, meus tios / minhas tias.

Negrinhas, no bom sentido. Aliás, não existem negrinhas no mau sentido. Aquelas meninas eram de bom calibre; as moradoras do São José, de propriedade do velho (o sítio, não as negrinhas, nem as branquinhas eram propriedade do velho, claro!) – E nem as morenas claras. Ele poderia, algumas vezes, até ter o enlace amoroso, sem essa de escravidão. Nunca ele pensou em ter a propriedade daquelas criaturas. Como eu disse acima, ele não tinha pendores para a escravidão. 

Aqui, faço um parêntesis: em alguns momentos, no texto ou fora dele, eu posso parecer meio licencioso, libertino. Mas não sou. E sei que alguns e algumas até riem dos meus chistes. Todavia (sempre gosto de uma via); todavia, eu ia dizendo: se alguém me julga libertino, isso não me interessa. São pessoas que perderam o trem na curva. Talvez, essas pessoas ostentem “moral” falsa, pra esconder seus defeitos (delas).

E uma coisa que me regozija é saber que as "moradoras" e os "moradores", como nós chamávamos, ali eram bem alimentadas (os). Havia frutas por todo o ano. E lavouras o ano inteiro. E não tinha essa de pobre passar fome, tendo comida para os donos das terras, que eram o meu avô e os filhos dele. 

Aquelas moças moradoras e namoradeiras eram fortinhas, de perninhas grossas. Coisa "louca". Loucura das boas! - Ah, que saudade me dá! – Não é “saudade do bate-papo, do disse me disse, lá do Café Nice”, não. É saudade das festas com as nossas “matutinhas” lá do São José.

E saudade me dá também, da passarada que ali habitava, pela força da natureza. Eram os beija-flores que, nas suas evoluções alegres, mais pareciam pessoas ansiosas dos dias de hoje. Mas só pareciam. Pois não tinham nada a ver com as ansiedades das gentes cheias de “tubulações”, como diz u’a amiga minha, querendo dizer tribulações. Os beija-flores voavam de arbusto a arbusto, beijando todas as flores que encontrassem. E as andorinhas iam ligeiras, como nos dizia o Altemar Dutra.

Então, vinham aqueles periquitos pequenos, passear junto a nós. Periquitos mansinhos e lisinhos. Chamo de periquitos pequenos, de forma bem carinhosa. Mas havia os papagaios; e os periquitos de tamanho razoável; assim como os periquitinhos pequeninos. Estes, bem fofinhos e de plumas tão macias que dava gosto a gente passar a mão naquela penugem! Aliás, penugem, só quando eles eram novos. Peninhas e pelinhos de qualquer cor; que as queríamos da cor que viessem. E como era grande o nosso interesse de preservar o meio ambiente. Não só os ambientes no meio. Também os ambientes dos cantos, dos cantinhos, por mais escondidinhos que estes fossem. – Ah, que saudade me dá! Repito: não é saudade do Café Nice, não. É saudade dos periquitos. Grandes ou pequenos. Todos inofensivos! Por vezes, sonsinhos, o que lhes dava mais charme

**Até a próxima, ainda nessa linha; sem sair da linha. /.



sexta-feira, 11 de março de 2016

De galhos e de crônica



terça-feira, 29 de junho de 2010

 

José Fernandes Costa*

Estou falando no dia 15 de junho de 2010. E naquele 15 de junho, eu escrevi estas tortuosas linhas. Não vou dissimular sentimentos. Nem descontentar ninguém! Falo de coisas soltas. Mas nem tão desconexas. Algumas podem não ter sentido – para alguns. Pra mim, têm. Outras: com o esforço dos meus quatro ou cinco leitores, poderão eles encontrar o sentido delas. Tudo, a critério do entendedor.

De início, dirijo-me a um Zezinho de Tal. Pra dizer a ele que uma das primeiras matérias que li hoje (dia 15.6.2010) no jornal, foi a crônica do Sebastião Nery. Sobre o Maradona, “o reizinho índio descido dos Andes”, como diz o Nery. E a vaia em Turim, em 1990, na hora em que o hino nacional da Argentina estava sendo cantado. Tudo isso, segundo o Nery. – Para mim, é tremendo desrespeito muito ao gosto dos torcedores do futebol. Seja na Itália, seja no Brasil ou na Inglaterra. Mas, foi muito boa a crônica do Nery. A vaia NÃO tem nada de bom. Digo isso para que o Zezinho não fale mais que eu puxo o Sebastião Nery para o esgoto. – “Dai a César o que é de César...” E dai à Argentina e ao Maradona, o que é da Argentina e do Maradona.

Dizem que neste 15 de junho (dia em que escrevo), está havendo jogos pela Copa 2010. Se há jogos ou não, pouco se me dá. Tanto que nem tinha eu o intuito de falar em futebol. Mas já que falei na vaia contra os argentinos, resolvi ir um pouquinho adiante.

Ora, pessoas matam e morrem por causa de futebol. Mas a gangue internacional que comanda toda essa cadeia criminosa do futebol, ganha muito dinheiro à custa dos bobos. Notem que clubes de futebol não pagam um centavo de impostos. Também não pagam o que devem à  Previdência Social. Igualmente não pagam contas de energia elétrica, nem qualquer outra conta de serviços públicos. Mas nós pagamos. 


E nenhum governo tem o topete de pedir a penhora, por meios judiciais, da sede de um clube de futebol. Nem de pedir que seja decretada falência / insolvência dos clubes e dos seus diretores. Porque se assim fizessem os tais governos iriam perder milhões de votos dos alienados futebolísticos. – Bastam estas palavras sobre o futebol. Já gastei meus verbos demais com essa de futebol. – (*Mas, quando a Argentina for jogar contra a Coreia do Sul, eu estarei torcendo pela Argentina – lembrem-se disso.) ... 2. Depois, falo mais um pouquinho. /.
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quinta-feira, 10 de março de 2016

Carta e mensagem



Sexta feira, 15 de Maio de 2009.

José Fernandes Costa

De início, separo ciências de religiões. Em princípios de abril p. findo, o senhor José Antônio Taveira (Zé Antônio) distribuiu mensagem, via correio eletrônico. Com ela, veio uma carta atribuída ao padre Luiz Carlos Lodi da Cruz. Segundo se lê ali, a carta é de apoio ao bispo de Olinda e Recife, Dom José Cardoso, por ter este fincado pé contra o aborto da menina de 9 anos, estuprada pelo padrasto, em Alagoinhas (PE). E por ter proclamado, alto e bom som, a excomunhão dos médicos e demais pessoas que participaram do aborto. – Essa menina de 9 anos estava grávida de gêmeos!

Premido por ocupações durante o mês de abril deste ano de 2009, só agora encontrei tempo para este comentário. Assim, volto à polêmica que se instalou sobre médicos e bispo, por causa daquele aborto legal (CP - Art. 128, II). A dita carta do senhor Lodi, é de um primarismo e de uma futilidade tais, que nos espanta pensar que foi escrita por um padre. Se assim é, faltou dizer que esse bispo Cardoso já foi santificado em vida, pelo seu “ato de coragem”. Seria o bravo santo dom Dedé.

Já começa a carta falando em "mártir em defesa da vida". Será o inconfidente excomungador? E o Zé Antônio faz questão de grafar o nome do bispo todo em maiúsculas, repetidas vezes, para passar a ideia de que se trata de grande líder. Mas isso é falso.

Mártir são as centenas de padres abnegados que, seguindo os ensinamentos de Cristo, embrenham-se em lugarejos sem nenhum conforto e passam a defender os marginalizados. Esses sacerdotes sofrem constantes ameaças e muitos deles são executados pelos "donos" das províncias, por terem sido estes contrariados nos seus interesses mesquinhos. Eles, os padres, buscam os direitos mais elementares da pessoa humana. E por isso são mortos fria e covardemente.

Sabendo-se que o Vaticano é um Estado e que o papa é chefe de Estado, o que têm feito os papas, junto a outros chefes de Estado, mundo afora, para proteger os padres que fizeram opção pelo direito à vida desses desafortunados, oprimidos e marginalizados? Muitos desses religiosos se dão por inteiro, em busca dos direitos dessas pessoas, nos grotões do mundo, por abnegação. Não por vontade do Vaticano. Temos um bom punhado desses padres, em todo o mundo. Vamos citar, como exemplo, dom Pedro Casaldáliga, bispo católico espanhol, nascido na Cataluña. Casaldáliga chegou ao Brasil em 1968. Começou pela Amazônia. Depois se fixou em São Félix do Araguaia – Mato Grosso.

Mas esses devotados são exceções dentro da Igreja Católica. Se eles não temerem as ameaças, já foi dito, podem ser assassinados, por contrariarem interesses dos endinheirados, que vivem de bem com a igreja. Porque esses poderosos de plantão costumam ir à missa aos domingos e comungam para que todos vejam como são “religiosos”.

O padre jesuíta, João Bosco Penido Burnier, foi cumprir uma missão de humanidade, lá mesmo no Mato Grosso, juntamente com dom Casaldáliga. Padre Penido Burnier morreu com um tiro na nuca. Tiro esse disparado por policiais bandidos que sempre ficam na defesa dos donos dessas longínquas províncias.

Prosseguindo: Zé Antônio sai julgando todos. Ele é a própria palmatória do mundo. Fala dos "que se dizem católicos". E diz que vai "reproduzir acontecimentos verdadeiros" (é o dono da verdade absoluta). E mais acrescenta: "... atos perpetrados por médicos sem consciência...” (Ainda se apodera ele das consciências alheias). – Zé Antônio é defensor ad hoc do mártir da excomunhão.

Ele transcreve o artigo do padre Luiz Lodi, que seria o primeiro de apoio ao bispo. Mas esse apoio foi primeiro e único. Pergunto: sendo o jornal "A Mensagem Católica", de propriedade da arquidiocese, iria publicar algum artigo de repúdio ao bispo? - Elementar, não?

Levantar a hipótese de que aquela mãe teria sido coagida a assinar a autorização para o aborto em sua filha, revela muita ignorância. Onde estariam os ditos assessores jurídicos da arquidiocese? Onde estaria o Ministério Público e a Secretaria de Saúde do Estado, que a tudo acompanharam? E, por acaso, os médicos não iriam desconfiar de algo estranho no comportamento daquela mãe, acaso tivesse havido coação? Onde fica a reputação dos médicos, que fizeram tudo às claras, com base na lei penal e na ética médica? Nenhum outro interesse moveu médicos e equipe, a não ser o de ajudar àquela menina.

Essa hipótese aventada, de que poderia ter havido fraude, revela má-fé, da parte de quem fez essa carta tão cheia de atalhos e de atos falhos. Na carta, diz mais o padre Lodi que, nos seus trabalhos pró-vida, "enquanto as feministas ofereciam o aborto, nós, os cristãos, oferecíamos acolhida, hospedagem, assistência espiritual e acompanhamento durante a gestação, parto e puerpério!”

Quanta benevolência! Mas aqui em Recife NÃO se viu nada disso. O arcebispo nunca foi ao Imip conversar com aquela mãe e passar a mão na face da criança grávida. Isso, sim, seria um ato de coragem, que ele NÃO teve e NEM terá, porque lhe falta humildade. E atitudes que tais NÃO fazem parte do ego NEM do currículo desse arcebispo (aqui, permito-me julgar também.)

E se a Igreja já ofereceu a alguma mãe em condições semelhantes, qualquer acompanhamento até o puerpério, o que terá feito após o puerpério, quando inúmeras mães ficam loucas e morrem na miséria, com seus filhos, pelas ruas e em frente às milhares de igrejas, católicas ou não? Elas morrem, juntamente com seus filhos que nunca pediram pra nascer. Morrem de fome e das doenças advindas dos maus-tratos dessa vida Severina; dessa vida bandida, calcada na hipocrisia e no farisaísmo!

Cadê o direito à vida, tão defendido pela Igreja Católica e tão invocado na carta sob comento. A Igreja Católica condena os contraceptivos. Por dever de justiça, deveria fazer alguma coisa para reduzir a fome que assola três quartos da humanidade no mundo inteiro. Mas fecha os olhos. Faz que não vê. Então, não misturem fé com saúde pública.

Também é dito na carta que "as crianças geradas de estupro costumam ser alvo de carinho especial de suas mães". (??) – E que "o bebê, fruto do estupro, serve como “um doce remédio à mãe estuprada”, para remir o trauma do estupro." Onde está a prova, ao menos empírica, dessa afirmação? É um grande engodo que nos tentam passar.

Essa dita carta foi tão mal-engendrada, que nela se fala em possível cesariana. Quanto farisaísmo! Todos sabemos que foram administrados comprimidos abortivos à menina e que os fetos foram expelidos naturalmente. Só o padre e o bispo não sabem.

Também pudera. Ninguém da Igreja se interessou pela sorte daquela criança. Se houvesse interesse, algum representante da Igreja Católica teria ido ao Imip verificar as condições da menina grávida. É o mínimo a esperar, já que o tema dominava as manchetes da imprensa, mundo afora. E se tratava de gravidez de alto risco. Mas o que fizeram os que condenaram o aborto?

O que fizeram foi ordenar ao diretor-superintendente do Imip que não permitisse que fosse feito o abortamento lá. E, em seguida, quando o aborto foi feito pelos médicos do Cisam, o arcebispo encheu o peito para proclamar a excomunhão de todos que dele participaram.

E o padre Lodi ainda levanta a suspeita de que o hospital e os médicos depois da cesariana devem "ter jogado os fetos no lixo, esperando que morressem!" Quem escreveu essa carta, se padre ou não, deveria ter assinado. Para responder a processo por calúnia e injúria. Pois ainda diz a pretensa carta que os médicos "teriam de ter sangue frio para olharem nos olhos de suas duas vítimas abortadas?" O ator mambembe que engendrou essa carta desconhece os compromissos do bom médico.

Com essas insinuações cavilosas, teria de ser levado aos tribunais, para provar o teor das suas leviandades, assacadas contra médicos e seus auxiliares, assim como contra as mulheres da ONG Curumim.

Tudo isso, além de ser mais um tremendo desrespeito ao Cisam e aos médicos e equipe que salvaram a menina sem nome, é pura maldade. São afirmações desastrosas e cruéis.

Grande defeito dos humanos é a dupla moral: pregar uma coisa e fazer outra. É a moral do "faça o que eu mando, mas não faça o que eu faço".

Ainda é dito na carta que o aborto é monstruosidade maior do que o estupro! Quem é capaz de aferir isso? A Igreja, o bispo, um padre? Como é que eles avaliaram esses sentimentos? - Só a mulher que foi estuprada pode falar do trauma do estupro. Nem igrejas, nem bispos, nem padres! Afirmar isso, é chafurdar nas emoções alheias!

E foram feitas citações de um montão de artigos da nossa legislação, que nada têm a ver com esse episódio. Nada pertinentes. Para que esse desperdício? Bastaria haver citado o art. 1º do nosso Código Penal, que assim se expressa:

CP - art. 1º Não há crime sem lei anterior que o defina. Não há pena sem prévia cominação legal. Igual enunciado está no art. 5º, inciso XXXIX da nossa Constituição Federal de 1988.

E nenhuma lei cataloga como crime o aborto praticado por médico, no caso de gravidez resultante de estupro, desde que haja consentimento da gestante ou, se esta for incapaz (menor de idade, por exemplo), consentimento do seu representante legal (no caso em tela, a mãe da menina consentiu.)

Se o bispo e seus defensores têm provas de que houve fraude por parte das mulheres da ONG Curumim, abram um processo judicial e mostrem as provas. Mas não escrevam bobagens, tentando defender o indefensável.

Por fim, pergunto: se a mulher incorrer no crime de aborto (CP - Art. 124), ela tem direito a defesa ou deve ser condenada sumariamente, pelas leis da "santa" inquisição?