Por
Luciana Grassano Melo
Professora
de Direito da UFPE
Sobre o impeachment
Esta
semana, estudando a história dos processos de impeachment no mundo, deparei-me
com a célebre frase do ex-presidente americano Bill Clinton: “Não tive relações
sexuais com aquela mulher… Senhorita Lewinsky”. Clinton disse isso em 26 de
janeiro de 1998, no final de uma conferência que proferia na Casa Branca. Com
olhar fixo nas câmeras, arrematou: “Nunca pedi a ninguém que mentisse, nem uma
só vez, nunca. Estas afirmações são falsas e agora tenho de regressar ao
trabalho para o povo americano”.
De
início, o juiz Starr e os adversários de Clinton estavam apenas interessados em
provar o perjúrio, repetindo exaustivamente que um presidente não deve mentir.
Depois, seus adversários perceberam que deveriam explorar também as práticas
sexuais entre Clinton e Lewinsky, passando a repetir exaustivamente que um
presidente assim pervertido seria intolerável.
Nos dias
11 e 12 de dezembro, os republicanos da comissão jurídica votaram a favor do
impeachment contra Clinton, pelo caso Lewinsky. Em 18 de dezembro, o debate foi
iniciado na Câmara de Representantes, que um dia depois confirmou, por maioria
absoluta, o perjúrio perante o júri e a obstrução à justiça. Em 7 de janeiro de
1999 teve início o processo de impeachment contra Clinton perante o Senado que,
em 12 de fevereiro votou contra, autorizando Clinton a terminar a sua segunda
legislatura.
O
seguimento do caso Lewinsky demonstrou que a opinião pública já estava farta
daquelas operações de rastreio da vida privada do presidente, inclusive dos
detalhes sórdidos, arvorados como meios de prova pelo juiz Starr, de mandar
examinar um vestido de Mônica Lewinsky, em busca de restos de esperma de
Clinton. A opinião pública soube distinguir entre a obra do presidente e a
discussão sobre se era ou não um marido virtuoso.
A cada
reflexão que faço sobre o caso deparo-me com o ridículo, o escárnio e a
hipocrisia. Bill Clinton, então, tornou-se o bode expiatório de todos os
adúlteros americanos. Adúlteros americanos que entendiam que ele, e somente
ele, deveria dizer a verdade de sua traição perante a mulher, os filhos e todo
o resto do mundo.
Não pude
deixar de fazer um paralelo com o ridículo, o escárnio e a hipocrisia do
processo de impeachment contra a presidente Dilma, em curso no Brasil. O
suposto crime de responsabilidade que embasaria o pedido de impeachment remete
à prática das chamadas pedaladas fiscais, que é corriqueira na política
nacional, entre ex-presidentes, governadores e prefeitos. É certo que talvez
não seja tão corriqueira, quanto o adultério.
A
presidente Dilma tornou-se o bode expiatório de todos os “pedaladeiros”
brasileiros. “Pedaladeiros” que entendem que ela, e somente ela, deveria ser
politicamente virtuosa para governar sem recorrer às pedaladas fiscais. Pois é
... Não é à toa que Raul Seixas, ironizando, cantarolava: “Quando acabar, o
maluco sou EU”. (??)
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