quarta-feira, 31 de janeiro de 2018




Mulher em apuros: RELATOS DA PRIMEIRA DEPILAÇÃO

Foi assim que decidi, por livre e espontânea pressão de amigas, render-me à depilação na virilha. Falaram que eu ia me sentir dez quilos mais leve. Mas acho que pentelho não pesa tanto assim. Disseram que meu namorado ia amar, que eu nunca mais ia querer outra coisa. Eu nem imaginava que ia doer, porque elas ao menos não me avisaram que isso aconteceria. Mas não esperava que por trás disso, e bota por trás nisso, havia toda uma indústria pornô-ginecológica-estética. – Oi, queria marcar depilação com a Penélope. – Vai depilar o quê? - Virilha. – Normal ou cavada? Parei aí. Eu lá sabia o que seria uma virilha cavada. Mas já que era pra fazer, quis fazer direito. – Cavada mesmo. - Amanhã, às... Deixa ver...13h? - Ok. Marcado. – Chegou o dia em que perderia dez quilos. Almocei coisas leves, porque sabia lá o que me esperava; coloquei roupas bonitas, assim, pra ficar chique. Escolhi uma calcinha apresentável. E lá fui. Assim que cheguei, Penélope estava esperando. Moça alta, mulata, bonitona. Oba, vou ficar que nem ela, legal. Pediu que eu a seguisse até o local onde o ritual seria realizado. Saímos da sala de espera e logo entrei num longo corredor. De um lado a parede e do outro, várias cortinas brancas. Por trás delas ouvia gemidos, gritos, conversas. Uma mistura de "Calígula" com "O albergue". Já senti um frio na barriga ali mesmo, sem desabotoar nem um botão. Eis que chegamos ao nosso cantinho: uma maca, cercada de cortinas. – Querida, pode deitar. Tirei a calça e, timidamente, fiquei lá estirada de calcinha na maca. Mas a Penélope mal olhou pra mim. Virou de costas e ficou de frente pra uma mesinha. Ali estavam os aparelhos de tortura. Vi coisas estranhas. Uma panela, uma máquina de cortar cabelo, uma pinça. Meu Deus, era “O Albergue” mesmo. De repente ela vem com um barbante na mão. Fingi que era natural e sabia o que ela faria com aquilo, mas fiquei surpresa quando ela passou a cordinha pelas laterais da calcinha e a amarrou bem forte. – Quer bem cavada? – É... é, isso. – Penélope então deixou a calcinha tampando apenas uma fina faixa da “Abigail”, nome carinhoso de meu órgão genital; esqueci-me de apresentá-lo antes. – Os pelos estão altos demais. Vou cortar um pouco senão vai doer mais ainda. – Ah, sim, claro. Claro nada, não entendia porra nenhuma do que ela fazia. Mas confiei. De repente, ela volta da mesinha de tortura com uma espátula “melada” de um líquido viscoso e quente (via pela fumaça). – Pode abrir as pernas. – Assim? – Não, querida. Que nem borboleta, sabe? Dobra os joelhos e depois joga cada perna pra um lado. – Arreganhada, né? Ela riu. Que situação. E então, Pê passou a primeira camada de cera quente em minha virilha virgem. Gostoso, quentinho, agradável. Até a hora de puxar. Foi rápido e fatal. Achei que toda a pele de meu corpo tivesse saído; que apenas minha ossada havia sobrado na maca. Não tive coragem de olhar. Achei que havia sangue jorrando até o teto. Até procurei minha bolsa com os olhos, já cogitando a possibilidade de ligar para o Samu. Tudo isso buscando me concentrar em minha expressão, para fingir que era tudo supernatural. Penélope perguntou se estava tudo bem quando me notou roxa. Eu me havia esquecido de respirar. Tinha medo de que doesse mais. – Tudo ótimo. E você? Ela riu de novo como quem pensa "que garota estranha". Mas deve ter aprendido a ser simpática para manter as clientes. O processo medieval continuou. A cada puxada eu tinha vontade de espancar Penélope. Lembrava-me de minhas amigas recomendando a depilação e imaginava que era tudo uma grande sacanagem, só pra me fazer sofrer. Todas recomendam a todas porque se cansam de sofrer sozinhas. – Quer que tire dos lábios? – Não, eu quero só virilha, bigode não. – Não, querida, os
lábios dela aqui ó!! – Não, não, para tudo! Depilar os tais grandes lábios ? Putz, que ideia. Mas topei. Quem está na maca tem que se foder mesmo. - Ah, arranca aí. Faz isso valer a pena, por favor. Não bastasse minha condição, a depiladora do lado invade o cafofinho de Penélope e dá uma conferida na Abigail. – Olha, tá ficando linda essa depilação. – Menina, mas tá cheio de pelo encravado aqui. Olha de perto. Se tivesse sobrado algum pentelhinho, ele teria balançado com a respiração das duas. Estavam bem perto dali. Cerrei os olhos e pedi que fosse um pesadelo. "Leva-me daqui, Deus, me teletransporta". Só voltei à terra quando entre uns blá-blá-blás ouvi a palavra pinça. – Vou dar uma pinçada aqui porque ficaram uns pelinhos, tá? – Pode pinçar, tá tudo dormente mesmo; tô sentindo nada. Estava enganada. Senti cada picadinha daquela pinça filha da mãe a arrancar cabelinhos resistentes da pele já dolorida. E quis matá-la. Mas mal sabia que o motivo para isso ainda estava por vir. – Vamos ficar de lado agora? – Hein? – Deitar de lado pra fazer a parte cavada. Pior não podia ficar. Obedeci à Penélope. Deitei de ladinho e fiquei esperando novas ordens. – Segura sua bunda aqui? – Hein? - Essa banda aqui de cima, puxa ela pra afastar da outra banda. Tive vontade de chorar. Eu não podia ver o que Pê via. Mas ela estava de cara para ele, o “olho que nada vê”. Quantos haviam visto, à luz do dia, aquela cena? Nem minha ginecologista. Quis chorar, gritar, peidar na cara dela, como se pudesse envenená-la. Fiquei pensando nela acordando à noite com um pesadelo. O marido perguntaria: - Tudo bem, Pê? – Sim... sonhei de novo com o cu de uma cliente. Mas de repente fui novamente trazida para a realidade. Senti o aconchego falso da cera quente besuntando meu “Twin Peaks”. Não sabia se ficava com mais medo da puxada ou com vergonha da situação. Sei que ela deve ver mil cus por dia. Aliás, isso até alivia minha situação. Por que ela lembraria justamente só do meu, entre tantos? E aí me veio o pensamento: peraí, mas tem cabelo lá? Fui impedida de desfiar o questionamento. Pê puxou a cera. Achei que a bunda tivesse ido toda embora. Num puxão só, Pê arrancou qualquer coisa que tivesse ali. Com certeza não havia nem uma preguinha pra contar a história mais. Mordia o travesseiro e grunhia ao mesmo tempo. Sons guturais, xingamentos, preces, tudo junto. – Vira agora do outro lado. – Porra... por que não arrancou tudo de uma vez? Virei e segurei novamente a bandinha. E então, piora. A bruaca da salinha do lado novamente abre a cortina. - Penélope, empresta um chumaço de algodão? Apenas uma lágrima solitária escorreu de meus olhos. Era dor demais, vergonha demais. Aquilo não fazia sentido. Estava me depilando pra quem? Ninguém ia ver o “tobinha” tão de perto daquele jeito. Só mesmo Penélope. E agora a vizinha inconveniente. – Terminamos. Pode virar que vou passar a maquininha. –

Máquina de quê?! – Pra deixar ela com o pelo baixinho, que nem campo de futebol. – Dói? – Dói nada. – Tá, passa essa merda... – Baixa a calcinha, por favor. Foram dois segundos de choque extremo: "Baixe a calcinha".... como alguém fala isso sem antes pegar no peitinho? Mas o choque foi substituído por uma total redenção. Ela viu tudo, da perereca ao cu. O que seria baixar a calcinha? E essa parte não doeu mesmo, foi até bem agradável. – Prontinha. Posso passar um talco? – Pode, vai lá, deixa a bicha grisalha. – Tá linda! Pode namorar muito agora. – Namorar... namorar?!... eu estava com sede de vingança. Admito que o resultado é bonito, lisinho, sedoso. Mas doía e incomodava demais. Queria matar minhas amigas. Queria virar feminista, morrer peluda, protestar contra isso. Queria fazer passeatas, criar uma lei antidepilação cavada. Mas eu ainda estou na luta... Fica a minha singela homenagem para nós mulheres! /.                                                               NOTA da redação: - Autora ANÔNIMA.

terça-feira, 30 de janeiro de 2018



O assassinato de Margot Proença

José Fernandes Costa – jfc.cost15@gmail.com

"No dia em que foi assassinada, Margot trajava blusa de algodão branca. E saia xadrez, nas cores verde e vermelho. Sapatinhos de salto baixo, parecia uma colegial. Tinha 37 anos de idade.”
Esse é um trechinho da narrativa em que a advogada e procuradora de Justiça do Estado de São Paulo, Luiza Nagib Eluf, inicia o relato de um homicídio passional e cruel. A vítima foi a professora Margot Proença Gallo, mãe da atriz Maitê Proença. – Maitê, na época, tinha 12 anos de idade! - O autor do crime foi o marido de Margot, o procurador de Justiça, Augusto Monteiro Gallo. Enciumado e enfurecido, Augusto Gallo matou a esposa, com 11 facadas, em meio a uma discussão iniciada por causa dos caprichos dele! Esse homicídio ocorreu em Campinas SP, no dia 7 de novembro de 1970. – E é um dos 16 homicídios passionais, tratados no livro: "A paixão no banco dos réus", escrito por Luiza Nagib Eluf.
Após o homicídio, Augusto fugiu no carro dele, levando a faca (arma do crime), que nunca foi encontrada. Ele foi para Bragança Paulista (SP); e, de lá, foi para Belo Horizonte, onde ficou homiziado na casa de um “amigo”.
No dia 17 de novembro, 10 dias após o crime, Augusto Gallo voltou a Campinas e se apresentou à polícia. Relatou o episódio ao delegado, à sua maneira; e se disse arrependido; mas acrescentou que não tinha peso na consciência. – Não foi preso.
Essa tragédia, segundo a versão dada pelo próprio homicida, na delegacia de polícia, naquele 17 de novembro, teria tido o seguinte ponto de partida: que Augusto Gallo chegara em casa às 18 horas, no dia 3 daquele mês de novembro. E a empregada informara que o jantar estava pronto, mas a dona Margot acabara de sair e disse que voltaria em cinco minutos. Era terça-feira. E todas as terças-feiras o jantar era servido naquele horário, porque Augusto iria dar aula em seguida.
Que ele achou entranha a atitude da mulher e resolveu seguir Margot. Que a encontrou nos Correios, onde ela estava postando uma carta. Que ele se aproximou por detrás da esposa; e, sem que ela percebesse, tomou a carta das mãos dela, na hora que a funcionária se preparava pra receber a carta e passar na máquina de selagem.
Que Margot reagiu e tentou tomar a carta de volta. E, na confusão, a carta teria sido rasgada ao meio. Que ele pegou um pedaço da carta. E que, ao voltar pra casa e recompor aquela parte da carta, Gallo verificou, estarrecido, que se tratava de uma carta de “amor”, que seria endereçada ao professor francês Ives Gentilhomme. O professor Ives estivera em Campinas, meses antes, ministrando um curso do qual Margot havia participado. Foi aí, segundo Augusto Gallo, que ele se lembrou de que quando o professor estivera na cidade, as discussões entre o casal haviam aumentado. E cresceram suas suspeitas de que a mulher se envolvera com o professor.
Consta do livro que, após a cena nos Correios, Augusto Gallo teria esperado Margot na porta de casa, com uma arma de fogo na mão; que a ameaçou e bateu nela. E que, a seguir, ele fez Margot entrar no carro. E partiu, cidade afora! No percurso, várias vezes ameaçou matá-la. Mas não tivera coragem. Então, jogara o carro contra postes e outros obstáculos; mais de uma vez, sem sucesso. Por fim, entregou a arma à esposa e disse que ela o matasse! Margot se livrou da arma de fogo e conseguiu descer do carro, escapando da fúria de Augusto.
Pouco depois, Margot voltou pra casa, em companhia de um delegado de polícia. Que o delegado conversou com Augusto; e este prometera que tudo ficaria em paz; que ele nada faria contra a esposa. – Porém, seguiram-se dias tensos! Quando tudo parecia se acalmar, a empregada da casa, Zenilza, "detonou" a granada: disse que algumas vezes havia visto o professor Gentilhomme na casa do casal, quando Augusto viajava. – (Dizem que o diabo faz medo, não por ser diabo; mas por ser manhoso.)
A partir daí, Augusto Gallo começou a fazer investigações por conta própria, arquitetando sua iminente defesa. Quer no inquérito policial, quer no processo-crime. Ele foi atrás de várias pessoas, inclusive uma ex-empregada doméstica, que trabalhara em sua casa havia mais de 10 anos. Era Maria Bombonato que trabalhou com o casal na época que ambos viviam bem. Augusto quis saber se Maria notara alguma conduta estranha por parte de Margot, naquela época. Maria Bombonato informou ter percebido um relacionamento estranho de Margot com um ex-aluno de prenome Milton (?!) – Como Augusto era amigo do juiz José Augusto Marin, tudo foi facilitado em favor do réu. – Cerca de 40 pessoas foram ouvidas.
A filha Maitê Proença, com 12 anos de idade, foi ouvida pelo juiz e prestou declarações contra a mãe. – (Deve ter sido preparada para isso.) – Para mais ajudar e facilitar a defesa do criminoso, o juiz Marin ouvia as testemunhas na casa do próprio juiz. – O filho Renê, por ter só sete (7) anos de idade, não foi ouvido. – Mas o filho de criação, Jorge das Dores, de 23 anos, declarou que certa vez vira Margot em companhia de um oficial do Exército?!
Contudo, no curso do processo, nunca foi mostrado o suposto pedaço da carta que Margot teria feito para o professor francês?! E nem sequer foi ouvida qualquer pessoa dos Correios, pra confirmar ou negar os entreveros havidos, quando da pretensa postagem da carta naquela noite!
Margot Proença era professora de filosofia, no Colégio Estadual Culto à Ciência, em Campinas. Era querida e admirada pelo pessoal da área de educação e cultura, inclusive por alunos e ex-alunos. Houve muitos testemunhos em favor de Margot; mas nada disso serviu pra condenar Monteiro Gallo, que foi a dois julgamentos pelo Tribunal do Júri, da comarca de Campinas. E foi absolvido nos dois.
Não li a sentença de pronúncia. Mas, pelo que consta no livro, a parcialidade do juiz Marin já começou na peça de pronúncia. Visto que o promotor Alcides Salles recorreu da pronúncia. – Por ocasião do recurso, o promotor Alcides faz esta citação do jurista Nelson Hungria: - “O marido que surpreende a mulher e o tertius em flagrante; e, em desvario de cólera, elimina a vida de uma ou do outro; ou de ambos; pode invocar a violenta emoção. Mas aquele que, por simples ciúme ou meras suspeitas, repete o gesto bárbaro e estúpido de Othelo, terá que sofrer a pena inteira dos homicidas vulgares.

A mãe de Margot contratou o advogado Leonardo Frankenthal para acompanhar o inquérito policial e o processo-crime. E atuar como assistente de acusação. – Augusto Gallo contratou os advogados Álvaro Cury, Valdir Troncoso Peres e Nilton Silva Júnior. O promotor de Justiça era Alcides Amaral Salles.
O Tribunal do Júri de Campinas absolveu Augusto Monteiro Gallo duas vezes, por "legítima defesa da honra"?! - No primeiro julgamento a decisão dos jurados foi 7 X 0. A promotoria recorreu. E aquele julgamento foi anulado pelo Tribunal de Justiça de São Paulo. Por manifesta decisão contrária às provas dos autos. Posto que os jurados consideraram "que não houve excesso na conduta de Augusto Gallo; que ele agiu moderadamente, ao matar a esposa" .- (*Inciso vigente no CP da época.)
Na segunda sessão de julgamento, com a mesma tese, o Tribunal do Júri, machista e intolerante, tornou a absolver Monteiro Gallo (4 X 3). – (Onze - 11 - facadas de surpresa foi tido como "agir moderadamente e sem excessos"?! – Imagine o que seria considerado excessivo por aqueles julgadores?!)
O julgamento foi tão aberrante, que o juiz ouviu uma criança de 12 anos de idade, no plenário do Júri (Maitê Proença, filha do casal)! - O juiz José Augusto Marin, durante o inquérito e o processo-crime ouvia as testemunhas na própria residência de Marin, repita-se. Esse juiz José Marin era muito amigo do procurador Monteiro Gallo!
Mas a sentença transitou em julgado, já que não cabia mais recurso. – Por fim, o terceiro e definitivo julgamento de Augusto Monteiro Gallo foi um câncer generalizado que o levou ao suicídio, com dois tiros no coração, em julho de 1989 (19 anos depois de matar a esposa)! - É ISSO! /.