sexta-feira, 15 de abril de 2016

Luciana Grassano






Por Luciana Grassano Melo
Professora de Direito da UFPE

Sobre o impeachment

Esta semana, estudando a história dos processos de impeachment no mundo, deparei-me com a célebre frase do ex-presidente americano Bill Clinton: “Não tive relações sexuais com aquela mulher… Senhorita Lewinsky”. Clinton disse isso em 26 de janeiro de 1998, no final de uma conferência que proferia na Casa Branca. Com olhar fixo nas câmeras, arrematou: “Nunca pedi a ninguém que mentisse, nem uma só vez, nunca. Estas afirmações são falsas e agora tenho de regressar ao trabalho para o povo americano”.

De início, o juiz Starr e os adversários de Clinton estavam apenas interessados em provar o perjúrio, repetindo exaustivamente que um presidente não deve mentir. Depois, seus adversários perceberam que deveriam explorar também as práticas sexuais entre Clinton e Lewinsky, passando a repetir exaustivamente que um presidente assim pervertido seria intolerável.

Nos dias 11 e 12 de dezembro, os republicanos da comissão jurídica votaram a favor do impeachment contra Clinton, pelo caso Lewinsky. Em 18 de dezembro, o debate foi iniciado na Câmara de Representantes, que um dia depois confirmou, por maioria absoluta, o perjúrio perante o júri e a obstrução à justiça. Em 7 de janeiro de 1999 teve início o processo de impeachment contra Clinton perante o Senado que, em 12 de fevereiro votou contra, autorizando Clinton a terminar a sua segunda legislatura.

O seguimento do caso Lewinsky demonstrou que a opinião pública já estava farta daquelas operações de rastreio da vida privada do presidente, inclusive dos detalhes sórdidos, arvorados como meios de prova pelo juiz Starr, de mandar examinar um vestido de Mônica Lewinsky, em busca de restos de esperma de Clinton. A opinião pública soube distinguir entre a obra do presidente e a discussão sobre se era ou não um marido virtuoso.

A cada reflexão que faço sobre o caso deparo-me com o ridículo, o escárnio e a hipocrisia. Bill Clinton, então, tornou-se o bode expiatório de todos os adúlteros americanos. Adúlteros americanos que entendiam que ele, e somente ele, deveria dizer a verdade de sua traição perante a mulher, os filhos e todo o resto do mundo. 
   
Não pude deixar de fazer um paralelo com o ridículo, o escárnio e a hipocrisia do processo de impeachment contra a presidente Dilma, em curso no Brasil. O suposto crime de responsabilidade que embasaria o pedido de impeachment remete à prática das chamadas pedaladas fiscais, que é corriqueira na política nacional, entre ex-presidentes, governadores e prefeitos. É certo que talvez não seja tão corriqueira, quanto o adultério. 

A presidente Dilma tornou-se o bode expiatório de todos os “pedaladeiros” brasileiros. “Pedaladeiros” que entendem que ela, e somente ela, deveria ser politicamente virtuosa para governar sem recorrer às pedaladas fiscais. Pois é ... Não é à toa que Raul Seixas, ironizando, cantarolava: “Quando acabar, o maluco sou EU”.  (??)


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