quinta-feira, 1 de março de 2012

Mocidade e conflitos

No dia 1º de fevereiro de 1985, publiquei numa revista semanal, artigo que começava assim: “Em São Paulo, na madrugada de 6 de janeiro de 1985, um jovem de dezoito anos matou, a tiros e facadas, sua mãe, após esta haver desligado, com reclamações, um som que ele ligara em alto volume, momentos antes. Não satisfeito, assassinou, também, o pai e mais três irmãos menores. Preso no mesmo dia, o assassino dormiu e se alimentou normalmente. E declarou que antes do crime havia regressado de uma festinha onde tomara alguns refrigerantes. Com naturalidade, perguntou ao delegado se teria direito à herança dos bens materiais da família recém-destruída”.
Esse foi só o início do artigo daquela data. E novamente em São Paulo, na noite de 30.10.2002, uma jovem, às vésperas de completar 19 anos de idade, planejou a morte dos seus pais, e mandou executá-los, de modo cruel pelo namorado dela e o irmão deste.
Isso nos faz constatar que proporção elevada de pais e filhos vive o grande desencontro de cada dia. Os pais, muitas vezes implicam com coisas banais ou se contrapõem a ações e atitudes incorretas dos filhos. Estes, em certas fases da vida são rebeldes e inconformados; protestam contra tudo e não gostam de cumprir normas. Também, com relativa razão, não aceitam receitas prontas!
Ocorrências desse porte, em que filhos matam pais ou avós, têm-se repetido com relativa freqüência. Seja em São Paulo, seja em Manaus ou em Porto Alegre.
No referido episódio de 2002, que envolveu a família Von Richthofen novamente se falou em herança e outros bens materiais de pronta liquidez, como jóias e dinheiro. Mas tudo começou com a discordância dos pais de Suzane com um namoro mantido por ela, com um jovem de classe mais humilde e de costumes duvidosos.
Em situações desse tipo, os pais têm de considerar algumas sutilezas, para poder agir com a devida maturidade.
Nada obstante, não dá para acreditar que coisas tão pequenas resultem tragédias tão grandes. A frieza, a surpresa – as vítimas estavam dormindo –, os requintes de crueldade etc. Ademais, com comemorações subsequentes e ensaio de orgias logo após o crime. Atitudes essas que causam imensa perplexidade.
Nos momentos seguintes ao assassinato, inclusive no sepultamento, os dois filhos do casal trucidado, Suzane e Andréas, este, então, com 15 anos de idade, se comportaram como se nada houvesse acontecido.
As polícias trabalharam com muitas evidências e logo descobriram que os autores haviam sido a filha das vítimas, o namorado dela, e o irmão deste. Meses depois, houve a reconstituição do assassinato, pela Polícia Técnica. Os dois rapazes assassinos se apresentaram muito nervosos e choraram bastante. Foi necessário muito jeito, calmantes, e a interrupção dos trabalhos para conter o desespero de Daniel, o namorado de Suzane, que, como criança, tremia e chorava, por voltar ao local do crime e ver o cenário onde dias antes ele era ator.
Enquanto isso, Suzane, a filha dos mortos, e mentora do diabólico plano de execução, não derramou lágrimas. Falou naturalmente como se nada houvesse se passado ali.
Essas coisas nos remetem à complexidade do ser humano. A própria Psiquiatria e a Psicologia Forense têm dificuldades de lidar com tais comportamentos. Suzane Louise, moça de classe média alta, estudando o 1º ano do curso de Direito numa das melhores universidades de São Paulo, aparentemente, nada lhe faltava no campo material. Assim, espantou meio mundo com essa capacidade tão imprevista.
De outra forma, vejamos: - os pais não devem tudo aos filhos. E estes devem, ao menos, obediência a seus pais, afora outras obrigações. Por outro lado, os jovens de hoje recebem uma carga muito grande de informações; um verdadeiro bombardeio que, por vezes, deixa-os confusos. E isso não lhes dá maturidade. Pode, ao contrário, resultar muita instabilidade emocional. Nesse estágio da vida, adolescentes e jovens costumam ser agressivos com a família; aparentam autossuficiência; estão sempre contestando e não demonstram interesse em ajudar pai e mãe, negando-se a colaborar com os afazeres domésticos. De outra parte, são exigentes quando se dirigem aos pais para reclamar algo ou solicitar algum benefício. Querem presteza e rapidez, coisas que nem sempre dão em contrapartida. Mas tudo isso comporta as exceções de praxe.
É sabido que compete aos pais disciplinar o temperamento e as vontades dos filhos, impondo-lhes limites; e para que essa cadeia de formação se complete sem choques e com sucesso, é preciso que os primeiros saibam organizar o caráter dos segundos, exercendo autoridade nos moldes do bom senso.
É arriscado afirmar se os autores daquela monstruosidade merecem repulsa ou cuidados. Sem muito esforço, contudo, entende-se que houve uma violência no seu estilo maior. Que mais se poderia esperar de tipos violentos?
O comportamento é um aspecto psicossomático do indivíduo. O bom caráter é o temperamento disciplinado para as boas normas de conduta social. A personalidade se modifica, amiúde, conforme o meio onde vivemos. E tudo o que é transmitido pela genética está sujeito às influências do ambiente, que fazem parte da formação do caráter. Daí a necessidade de conhecermos os nossos filhos e o seu mundo.
Algumas imposições por parte dos pais podem ser interpretadas como desrespeito à individualidade da pessoa e poderá ser a gota que faltava para fazer transbordar a tina que já estava cheia. Entretanto, convém que se diga aos jovens que desespero e atos extremos nunca diminuirão dificuldades; pelo contrário, somente tendem a aumentá-las. E a vida é o nosso bem maior, que não devemos destruir, porque, com ela, quando tudo falta, resta ainda a esperança.

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